Zheit Entrevista Gabriel Toledano - Aerocast

Zheit Entrevista Gabriel Toledano - Aerocast

07/05/2019 10:20

Gabriel Toledano é o responsável e um dos fundadores do Aerocast, piloto privado, apaixonado por aviação e com formação de ciência aeronáuticas no Rio de Janeiro.

Confira a entrevista exclusiva realizada na Praça do Expedicionário que o Zheit fez com o Gabriel, falando de aviação, guerra, a restauração do P47 que está no Museu do Expedicionário em Curitiba e muita história e casos bizarros da aviação.

Zheit - A ideia de criar um podcast de aviação foi para criar um programa diferente dos quais existem e para criticar e expor pontos de vista diferenciados. Quais foram as consequências de trazer um ponto de vista que nem sempre está em consonância com as demais?   

Gabriel - A desinformação é uma coisa que me incomoda muito e, quando eu me informava sobre um assunto e ia conversar com uma pessoa que entendia de aviação, eu passava vergonha, porque eu me informava pela mainstream e acabava me desanimando, pois um cara leigo como eu, acabava se informando por um lugar que está errado. Então, eu quero trazer a informação certa e combater as fake news. Eu procuro fazer a verdade, sempre falando a verdade, por mais dura que seja, como por exemplo, se um acidente acontecer e for a culpa de uma pessoa, eu vou falar. 

Zheit Os podcasts sempre são repletos de muitas informações e documentos relatados, sempre com muito conhecimento técnico. O quão trabalhoso é fazer um podcast e qual foi o podcast mais difícil de fazer ou que rendeu mais debates?   

Gabriel - Depende muito do conteúdo. O acidente ocorrido em Cuba (18-05-2018), foi fácil porque eu gosto do Boeing 737 e eu sou muito observador, então, quando eu vi o leme do Boeing 737 e a foto na capa do G1 e as pessoas falando sem informação nenhuma, eu comecei a ver que tinha alguma coisa errada. A Blue Panorama que era companhia que estavam relacionando o acidente, tinha pintura azul marinho nos aviões e a na foto, o avião era de cor azul claro. Então, comecei a juntar os pontos, mas, esse fato foi muito natural para mim, pois tenho 10-15 anos de estudos , viro noites lendo livros, e é isso que eu tento passar para as pessoas que me ouvem. Porém, tem conteúdo que tem que ser muito certos, sem achismos, como o conteúdo que irei lançar sobre o estudo de um pouso de um Cessna 172 na Praça Vermelha no meio da Guerra Fria, pois o material servirá de referência para as pessoas. Então, depende muito do conteúdo. No podcast eu estudo muito sobre determinados assuntos. No podcast da Varig 254, eu não estudei nada porque a minha vida toda eu estudei esse acidente, então, foi natural.

Zheit - Hoje temos um crescimento abundante de informações e de profissionais formados por Google, simuladores e outros meios. O ponto é que, temos uma demanda muito grande de pessoas pesquisando, jogando e tendo suas pesquisas como verdade absoluta. Todo mundo nas redes sociais são profissionais sem nunca terem voado. Em contrapartida, surgiu muita gente boa trazendo informações relevantes sobre aviação. Hoje em dia, a internet veio ajudar ou piorar o acesso às informações aos amantes da aviação?   

Gabriel- As duas coisas. As pessoas que estão interessadas em simulação vão ser, no futuro, as que estarão envolvidas com aviação. O problema é, quando as pessoas começam a fazer simulações no computador, sendo a maioria de 12-13 anos, e acha que entende de alguma coisa, acaba atrapalhando com comentários no Youtube, pois eles não conseguem ter a noção do que acontece na aviação de verdade. Isso é um lado ruim. É a pessoa não ter conhecimento do assunto e tentar provar que eu estou errado.

Zheit - Apesar de gostar muito de aviação, sou um leigo em todos os sentidos, o que me faz ter outra visão daqueles que vivem a aviação e, na minha visão, estou percebendo uma crescente onda de pilotos sendo formados, um grande número de empresários e artistas adquirindo aviões. A questão é, na sua concepção, o Brasil está apto para ter uma demanda alta de pilotos sendo formados (legislação trabalhista, qualidade de manutenção de aeronaves, qualidade de pistas, qualidade na formação de pilotos)?   

Gabriel - O Brasil está em uma situação muito diferenciada do cenário global. Nos Emirados Árabes, por exemplo, já está faltando piloto, então eles estão reduzindo as rotas porque não tem piloto para fazer e, aqui no Brasil, temos uma demanda muito pequena para uma oferta muito grande de profissionais se formando. A quantidade de profissionais que se formam por ano, não conseguem entrar no mercado de trabalho, porque o Brasil não tem estrutura para absorver tantos profissionais, uma vez que, estes que estão sobrando no mercado de trabalho, tem qualificação baixa. Com relação à infraestrutura, o Brasil tem que melhorar muito, apesar que, o Aeroporto de Guarulhos após a privatização ficou muito melhor, o Galeão está melhorando e, aqui em Curitiba, o Afonso Pena é o melhor aeroporto do Brasil, ou seja, são focos de infraestrutura. Nos EUA e no Canadá um aeroporto pequeno, por exemplo, tem muita mais infraestrutura que no Brasil. Então, para a aviação crescer do modo que o Brasil merece, pelo tamanho territorial, vai demorar muito ainda. Mas, apesar disso, temos boas formações, muita escola boa e, a noção que eu tenho, é que as coisas têm melhorado em qualidade, apesar de ter um aumento na quantidade, a qualidade tem acompanhado. Os pilotos recém formados têm muito caminho pela frente. Os pilotos que saem formados em PC ou PCIRF -MLTE (Piloto Comercial + Instrumentos +Multimotor), até chegar em um ponto satisfatório, leva, pelo menos, 20 anos. É muito tempo. Se alguém pensa que vai ser como era na Varig do anos 80, que você saia da escola e já era contratado, isso já não existe mais.

Zheit Qual é a sua relação com o Museu do Expedicionário de Curitiba?  

Gabriel - A história é longa. No RJ tem o MUSAL, o museu aeroespacial e tem um acervo muito grande de materiais de mídia, como filmes da II Guerra originais, do P47, documentos. O problema é o seguinte, é muito difícil você tentar fazer alguma coisa no Museu. Eu tentei limpar um avião no Museu e falaram que eu tinha que me associar, pagar para ser sócio. E acabei desanimando, pois eu queria doar meu trabalho e não ter que pagar. Acabei desanimando de lá, perdi o gosto. Me mudei para Curitiba, vim no Museu do Expedicionário no dia mais frio do ano e fiquei apaixonado pelo P47. É diferente o modo que ele está colocado na praça, está próximo do público e isso não acontecia no Rio de Janeiro, os dois P47 que estão lá, estão dentro do Hangar, é escuro. Aqui no Museu tem coisas originais que são uma raridade, como a MG 42, a famosa Lurdinha da II Guerra. Então, minha relação com o Museu começou assim: eu sabia que tinha um P47, queria conhecer, cheguei aqui e não teve como não se apaixonar.

Zheit Em 2009 eu vinha em quase todas as reuniões do Museu do Expedicionário que se realizavam nas quartas-feiras à tarde. Tive experiência de conversar e confraternizar com o Major Bennur, com a Enfermeira Virgínia, com o Sr. Basílio, Sr. Geraldino, Sr. Eronides, que hoje é o Pracinha mais ativo em Curitiba. Naquela época não tinham jovens interessados em conhecer a história e muito menos em ouvir as histórias de nossos combatentes. Você, sendo um voluntário do Museu do Expedicionário, acha que damos o devido valor aos nossos heróis ou faltou um pouco de incentivo de trazermos os jovens para perto dos nossos heróis?  

Gabriel - O problema foi no retorno dos Pracinhas da Guerra. O Governo era ditatorial e os seguintes, eram Governos de esquerda e tentaram apagar a imagem dos militares. Também me chama a atenção que, os professores de história, pelo menos os que eu tive, são de esquerda. Então, é muito mais fácil tentar esconder a história do que aconteceu dos militares e contar somente a parte ruim, porque sim, houve parte ruim também, do que contar a parte boa, de que vencemos o Eixo, que o Brasil lutou e perdeu gente. Também é muito difícil contar a história para as crianças, de que houveram mortos, falar sobre sangue, do que falar sobre pessoas que torturaram jornalistas. Na minha escola eu não aprendi a história da II Guerra Mundial, a única coisa falada era que o Brasil tinha participado da II Guerra, falava sobre Hitler, sobre os Estados Unidos e acabou. Não tinha a Inglaterra, não tinha Canadá, não tinha Austrália e foi uma Guerra Mundial e, os meus colegas achavam que a Guerra era somente na Europa, Estados Unidos e Japão. Então, é muito difícil, hoje em dia, você tentar trazer uma excursão da escola pública, com professor de história de esquerda, que vai chegar no Museu e vai ter que conversar com Coronel. 

Zheit - Hoje, a formação de pilotos não é barata e muitas vezes os jovens não têm condições de pagar a formação para ser piloto e buscam realizar o sonho depois de alguns anos. Você acha que existe idade certa para iniciar na aviação? Daria algum conselho para quem que ama voar, mas nesse momento não tem condições ou tem medo de ir atrás?

Gabriel - Isso depende muito do seu objetivo. Se seu objetivo é se tornar um comandante master internacional na Emirates, se você começar com 30 anos, você não vai alcançar isso; se você começar com 18, você alcança. Mas isso depende de seu dinheiro também. Se você tem 18 anos e tem dinheiro para gastar, sua vida está muito mais fácil que a pessoa de 30 anos, com o mesmo dinheiro que você! Se você só quer ter o contato, está satisfeito em ser co-piloto com 50 anos de idade em uma companhia aérea nacional, voando turbo hélice, dá para entrar. Agora, se seu objetivo é um pouco mais ambicioso, você está lascado! 

Zheit - Quais foram os casos mais bizarros que você já ouviu em todos esses anos na aviação?

Gabriel - O caso do Varig 254, o acidente de 1989. Eu estudei minha vida toda esse acidente e ele é apaixonante em todos os sentidos da história que aconteceu, porque era a transição de uma época muito analógica para uma época digital, então a Varig introduziu um plano de vôo que induzia ao erro e os pilotos não tiveram treinamento. Nesse acidente, o piloto perdeu a orientação, ficou sem combustível e o avião acabou caindo. Na época, o comandante foi uma pessoa muito arrogante, sendo que hoje, esse acidente nunca teria acontecido. O relacionamento dele com o co-piloto era uma relação de cima para baixo, não uma relação horizontal, ou seja, era sempre o comandante mandando. Foi um absurdo tão grande nesse acidente que, era para o avião ir para o Norte e eles foram para Oeste e eles não conseguiram perceber isso a tempo e, quando o co-piloto percebeu e falou para o comandante voltar, o comandante falou não! 

Hoje em dia isso é tão absurdo e ensinou tanto para a aviação, que eu considero esse fato uma coisa totalmente inacreditável, é a coisa mais bizarra que eu já vi na aviação. O comandante soube que estava errado, podia ter voltado e não quis voltar por ego. Essa história foi se desdobrando ao longo do tempo, que hoje em dia, existe uma filosofia de CRM que é todo implementado em cima deste acidente, ou seja, a aviação inteira mudou depois desse acidente, a aviação mundial. A Boeing alterou o modo de fixação de suas poltronas, por causa desse acidente, porque somente uma pessoa morreu em virtude do impacto, as demais foram morrendo ao longo dos dias porque foram morrendo esmagadas com as poltronas que foram se soltando. Então, foi alterado o modo que fixava a poltrona no avião para aguentar mais e esse acidente é maravilhoso por vários motivos, por ter trazido um aprendizado, apesar de ter sido bizarro.

Ficou curioso? Veja o vídeo do Acidente Varig 254 

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Nota: O podcast foi feito como um plus. A entrevista foi gravada para não perder nenhum detalhe, mas o papo foi tão legal que resolvemos colocar na íntegra! A edição foi feita por um leigo só para não entregar a matéria bruta para vocês. Então ao pessoal que entende de som e edição, por favor calma! Respeite os limites e aprecie a entrevista escrita e, para quem não liga, e só quer ouvir um papo informal aproveite!! 

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Por Murilo Hubert Schenfeld